A importância dos fertilizantes orgânicos no Plano Nacional de Fertilizantes

Documento apresentado pelo governo demostra que os orgânicos podem aumentar produtividade agrícola e reduzir a dependência externa do insumo.

 

Fernando Carvalho Oliveiraengenheiro agrônomo da Tera Ambiental, salienta que o Plano Nacional de Fertilizantes 2050, lançado hoje (11/03) pelo presidente Jair Bolsonaro, embora apresente ações de longo prazo, é pertinente. “Afinal, reduzir a dependência externa é mandatório, como se observa agora ante o risco de desabastecimento em decorrência da crise no Leste da Europa”. No tocante aos orgânicos, de modo específico, o programa apresenta aspectos importantes.
O agrônomo da empresa, fabricante do fertilizante orgânico Tera Nutrição Vegetal, por meio do aproveitamento do lodo remanescente do tratamento de esgotos, enfatiza o trecho do documento apresentado hoje pelo governo no qual consta que “osfertilizantes organominerais constituem-se em alternativas relevantes para a redução da dependência de importação de minerais, pois agregam nutrientes ao solo, ao mesmo tempo em que potencializam a eficiência da sua aplicação. Cooperam para a construção e recuperação da fertilidade dos solos brasileiros — carentes em matéria orgânica, especialmente por promover melhoria significativa nas suas características físicas, químicas e biológicas”.
Oliveira frisa que o plano diagnostica com clareza a importância dos fertilizantes orgânicos, incluindo a definição de que “são ferramentas essenciais para melhorar a saúde do solo e sua capacidade de “sequestrar” e armazenar carbono, sendo imprescindíveis para o protagonismo da agricultura nacional nos aspectos relacionados às mudanças climáticas e ao aquecimento global. Melhorar a qualidade dos solos resulta em maior produtividade e, no médio/longo prazo, em menor investimento em insumos, aumentando a competitividade da produção agrícola e, consequentemente, reduzindo a necessidade de expansão da área plantada”.

 

Evolução do mercado de fertilizantes orgânicos
Além do diagnóstico correto, o plano governamental identifica com clareza a evolução do mercado, ao indicar que as vendas de fertilizantes organominerais sólidos para aplicação no solo tiveram crescimento de 20% ao ano, em média, em 2018 e 2019. O faturamento das indústrias do setor nesses segmentos de produtos (líquidos e sólidos) totalizou, em 2020, R$ 2,57 bilhões, faturamento 1,58 vez superior ao de 2015. Em 2020, o segmento apresentou expansão muito acima das expectativas, causado pelo aumento do nível de adoção desse tipo de produto pelos agricultores, em decorrência dos excelentes resultados obtidos na produção, especialmente nas grandes culturas.
Em 2020, ainda segundo consta do documento, prossegue Oliveira, as culturas que mais se destacaram no quesito “aumento de adoção dos orgânicos” foram as de soja, café, milho, cana-de-açúcar e as frutas, especialmente as destinadas à exportação. No café, os fertilizantes organominerais e orgânicos apresentaram o maior crescimento. Percebe-se, ainda, uma expansão relevante na produção/oferta de matérias-primas de base orgânica, obtidas por meio do processamento de resíduos agropecuários, especialmente os de origem animal e vegetal, que favorece a competitividade do setor. A cultura que mais gera resíduo é a de cana-de-açúcar.
O agrônomo da Tera observa, ainda, que o plano é realista ao identificar alguns fatores condicionantes ao êxito do aumento da produção e uso dos fertilizantes orgânicos, como a logística, organização dos sistemas de produção e adoção de metas obrigatórias de gerenciamento e segregação de resíduos sólidos pelos poderes públicos municipais, causando ampliação da oferta de material orgânico para a produção. Para Oliveira, porém, faltou uma abordagem mais enfática, nos moldes do tratamento dado pelo texto à produção de fertilizantes orgânicos a partir de resíduos agropecuários, daqueles advindos dos efluentes de esgotos e lixo urbano. “Isto precisaria estar mais detalhado”, pondera.
Quanto ao cronograma contido no plano para o avanço dos fertilizantes orgânicos, Oliveira destaca, na agenda de 2030, os seguintes itens: ampliação da oferta de formulações customizadas, atendendo às necessidades específicas dos agricultores em função da diversidade de solos e de culturas; desenvolvimento tecnológico para o aproveitamento dos nutrientes dos resíduos e a disponibilidade para sua utilização como fertilizante, reduzindo a limitação logística para aproveitamento desse potencial, em função da dificuldade de se transportar resíduos por longas distâncias (“Nesse sentido, empresas com tecnologia já comprovadamente eficazes, como a Tera, são importante para o êxito do programa”, acentua); mudanças fiscais relacionadas ao beneficiamento e movimentação dos orgânicos, de modo a viabilizar a competitividade desse tipo de produto em maiores distâncias da planta fabril; e integração dos fertilizantes organominerais e orgânicos com a cadeia tradicional.
Para os anos de 2040, os principais pontos, na visão do agrônomo, são os seguintes: instalação de polos de produção junto às fontes de resíduos da produção mineral; construção de instalações de linhas de produção de fertilizantes organominerais em pequena escala no local de geração de resíduos, administradas por produtores de fertilizantes, para a implementação de tecnologias baseadas em matérias-primas de base biológica; e a meta de que os fertilizantes orgânicos e organominerais atinjam entre 15% e 20% do consumo total do Brasil.

 

Posição da Tera
Oliveira explica que, tecnicamente, pode chegar a até 50% a substituição do fertilizante mineral pelo orgânico. Tal proporção, porém, somente é atingida em situações no qual a utilização deste é repetida durante três anos subsequentes. Em prazo mais curto, para atender a uma possível redução da oferta do insumo em decorrência da invasão da Rússia à Ucrânia, considerando a aplicação de cinco toneladas de fertilizantes orgânicos por hectare, na primeira aplicação deste já seria possível reduzir em até 30% a dose recomendada de minerais. “Isso já tem sido viável para várias culturas, dentre elas a cana-de-açúcar e citros”, informa. Quanto ao potencial de consumo dos fertilizantes orgânicos, o especialista explica que, “se considerarmos que o Brasil tem hoje cerca de 83,4 milhões de hectares cultivados e taxas de aplicação entre cinco e 10 toneladas por hectare/ano, a demanda oscilaria entre 417 milhões e 834 milhões de toneladas anuais”. O momento é oportuno para ampliação produtiva do setor, já que a demanda está garantida e os preços de venda do produto permanecerão compensadores.
O engenheiro agrônomo revela que a Tera está trabalhando para aumentar sua produção ainda este ano. “Em função da disponibilidade de matérias-primas (lodo produzido pelas estações de tratamento de efluentes), de sua capacidade operacional e da conjuntura econômica e geopolítica global, a meta é de um crescimento de até 25%. Com isso, a empresa passará a ter capacidade de atender a produção em área somada de 10 mil hectares.
“Estamos transformando um passivo ambiental em fertilizantes orgânicos compostos, num exemplo efetivo de economia circular e atividade sustentável”, enfatiza, concluindo: “O cumprimento eficaz do Plano Nacional de Fertilizantes 2050, hoje anunciado, poderá contribuir de modo concreto para que os fertilizantes orgânicos melhorem a produtividade da agricultura brasileira e reduzam a dependência externa do insumo”.

JORGE RORIZ