A morte do miliciano Adriano Nóbrega e suas ligações bolsonarianas

O miliciano Adriano da Nóbrega, morto em operação da polícia no domingo (9), em Esplanada, na Bahia, era suspeito de comandar um grupo que cometeu dezenas de homicídios, o Escritório do Crime.

O ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais (Bope) foi expulso da Polícia Militar por envolvimento com jogo do bicho e homenageado, mais de uma vez, pelo então deputado estadual Flávio Bolsonaro, hoje senador.

Adriano Nóbrega era conhecido como Capitão Adriano. Foragido havia mais de um ano, ele era alvo de um mandado de prisão expedido em janeiro de 2019.

Segundo a Secretaria de Segurança Pública da Bahia, o ex-capitão do Bope passou a ser monitorado por equipes do órgão a partir de informações de que ele teria buscado esconderijo na Bahia. De acordo com a SSP-BA, Adriano foi localizado em um sítio de um vereador do PSL de Esplanada.

Nesta segunda, a Corregedoria-geral da Secretaria de Segurança Pública da Bahia abriu investigação sobre as circunstâncias da morte do ex-PM. O advogado dele diz acreditar que ele foi vítima de queima de arquivo e que já temia ser assassinado.

O secretário de Segurança da Bahia rejeita a versão e disse que a versão é “estapafúrdia”.

Adriano era um dos denunciados da Operação Intocáveis, coordenada pelo Gaeco do Rio de Janeiro. Quando ela foi deflagrada, em janeiro de 2019, uma força-tarefa do Ministério Público e da Polícia Civil do Rio de Janeiro prendeu cinco homens acusados de integrar uma milícia que atuava em grilagem de terra, agiotagem e pagamento de propina em Rio das Pedras e na Muzema, duas favelas de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio.

O ex-policial era um dos três integrantes considerados chefes do grupo e o único foragido daquela operação.

Ao menos desde 2003, o ex-PM está envolvido com problemas na Justiça ou com a polícia. Entenda na linha do tempo abaixo.

Maio de 2003
Um técnico de refrigeração foi morto durante uma operação policial na Cidade de Deus. Quase 17 anos após o homicídio, o inquérito ainda não foi concluído.

Os acusados são dois policiais militares que, na época, pertenciam ao mesmo batalhão: Adriano da Nóbrega e Fabrício Queiroz – que anos depois ficaria conhecido pela suposta participação no esquema das “rachadinhas” da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) – esquema em que parte do salário dos assessores de deputados é devolvida ao parlamentar

Outubro de 2003
O deputado estadual Flávio Bolsonaro fez a primeira homenagem ao então tenente Adriano da Nóbrega. Uma moção de louvor em que destacou que o militar desenvolvia sua função com “dedicação” e “brilhantismo”.

Janeiro de 2004
Adriano foi preso por outro crime: a morte de um guardador de carros que, na véspera do assassinato, tinha denunciado um grupo de milicianos.

Junho de 2005
O deputado Flávio Bolsonaro fez nova homenagem a Adriano da Nóbrega, com a mais alta honraria da Alerj. O homenageado não compareceu à Assembleia para receber a Medalha Tiradentes porque continuava preso.

Outubro de 2005
Adriano foi condenado pelo homicídio em júri popular. Quatro dias depois da condenação, o então deputado federal Jair Bolsonaro fez um discurso na Câmara dos Deputados em defesa de Adriano. Bolsonaro contou que compareceu ao julgamento do PM, segundo ele, um “brilhante oficial”.

2007
Adriano recorreu da sentença e foi absolvido em novo julgamento. No mesmo ano, o ex-colega dele no Batalhão de Jacarepaguá, Fabrício Queiroz, já expulso da polícia, passou a trabalhar no gabinete do deputado Flávio Bolsonaro.

Segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro, Queiroz indicou a ex-mulher de Adriano da Nóbrega, Daniele Mendonça, que foi contratada como assessora do gabinete.

Setembro de 2008
Adriano da Nóbrega voltou a ser preso, por um atentado ao pecuarista Rogério Mesquita, inimigo de bicheiros.

Dezembro de 2013
Adriano foi expulso da PM do RJ por envolvimento com o jogo do bicho, mas não foi condenado por este crime na Justiça.

Abril de 2016
A mãe de Adriano, Raimunda Magalhães, foi nomeada assessora de Flávio Bolsonaro.

Dezembro de 2018
Começou a investigação sobre as rachadinhas na Alerj. De acordo com o Ministério Público, Adriano era um integrante da organização criminosa que agia no gabinete do então deputado Flávio Bolsonaro. E recebia parte de recursos vindos da “rachadinha”.

Segundo as investigações, o esquema seria operado pelo amigo de Adriano dos tempos da PM, Fabrício Queiroz.

A mãe de Adriano e a ex-mulher dele receberam de R$ 1 milhão em salários, mas não apareciam para trabalhar.

Deste total, R$ 200 mil foram transferidos para contas de Fabrício Queiroz. Outros R$ 200 mil foram sacados em dinheiro vivo. Os promotores acreditam que essa quantia foi repassada em mãos para o esquema.

A Justiça autorizou a quebra do sigilo telefônico de Adriano da Nóbrega. As conversas interceptadas pelos promotores indicaram que ele orientou a ex-mulher a não prestar depoimento.

Numa mensagem entre Adriano e a ex-mulher Daniele, o ex-capitão admitiu que recebia parte dos desvios de salários da Alerj. Mas os promotores desta investigação não conseguiram fazer novas buscas para obter mais provas contra Adriano. Ele estava foragido, e o último paradeiro só foi descoberto neste domingo (9).

O que dizem os citados
A defesa de Jair Bolsonaro e do filho Flávio disse que Adriano da Nóbrega não tem ligação com família Bolsonaro e que ele foi foi homenageado quando era ficha limpa e um herói da PM.

A defesa disse ainda que a família sempre prestigiou a categoria de policiais militares e homenageou inúmeros policiais.

Fonte: Jornal Nacional 10/02/2020

JORGE RORIZ