Color e Dilma em vários atos

José Carlos Aleluia
Impeachment não se faz em apenas um ato. Mas em vários. O impeachment do presidente Fernando Collor se anunciou quando ele traiu o eleitor, confiscando a poupança de quem nele votou confiante de que isso não aconteceria. Perdeu a legitimidade naquele dia em que anunciou o famigerado Plano Collor.
Não foi diferente 24 anos depois, quando a presidente Dilma Rousseff adotou uma política econômica totalmente contrária ao que pregara em campanha. Tudo o que condenara pôs em prática ao tomar posse. É imprudente pensar que o eleitor não percebe o ludibrio. Como Collor, nesse percalço começou o descrédito popular de Dilma.
O passo na direção da política resultou em novo tropeço. Dilma traiu a base, desprezando os partidos que lhe apoiavam ao apostar numa arquitetura política que transformaria o ministro Gilberto Kassab numa espécie de flautista de Hamelin, atraindo para uma nova legenda parte do PMDB e oposicionistas. O feitiço se virou contra a feiticeira. A manobra para esvaziar os aliados e desidratar a oposição não se viabilizou e acabou desarrumando a base.
Collor e Dilma falharam na política, na economia e, principalmente, na preservação da imagem de líder confiável, que, no caso dela, apresenta o quadro de falência múltipla. A inábil presidente ainda dificultaria sua administração com uma reforma ministerial sem combinar com os líderes de sua base. Preferiu contemplar o baixo clero na recomposição da aliança. O padrinho dela, Lula, já reconheceu que o arremedo não deu certo.
Collor também apostou numa reforma ministerial, mas, diferentemente de Dilma, ele a realizou selecionando notáveis para a composição dos ministérios. Mesmo assim falhou. Os dois seguem caminhos paralelos em tempos diferentes da história. Erra Dilma, como Collor, ao achar que, sem uma base política sólida, será vitoriosa em confronto com a opinião pública no Congresso Nacional. Collor também pensava assim e o fim da história a gente já conhece.
No atual Congresso, existem o grupo a favor do impeachment, outro contra e um terceiro, a maior parcela de parlamentares, que ainda não se decidiu. Quem já se decidiu pelo afastamento da presidente não volta atrás. Aqueles que estão em dúvida vão aguardar o desenrolar dos acontecimentos. Já entre aqueles que estão do lado de Dilma, assim como se deu com Collor, a possibilidade de deserção é grande. O PMDB não tem por que ser leal a Dilma na queda. Os peemedebistas convergem para a unidade numa nova fase.
Quando se desencadeia o processo de impeachment, o governo fica obcecado pela aritmética. A experiência de Collor deveria servir de exemplo a Dilma. Mas a soberba cega. A atual presidente comete o mesmo equívoco daquele que foi impichado há 23 anos. Ela não aprendeu que não se aplica a aritmética quando os números são mutantes e seguem os ventos soprados pela opinião pública. Para piorar a situação, novas prisões ainda acontecerão e novas delações virão à tona.
O Fiat Elba foi apenas o pano de fundo para o gran finale de Collor. Não faltam motivos e outros ainda deverão surgir para sacramentar o afastamento de Dilma Rousseff. O impeachment dela é por justa causa, como o de Collor. Os dois incorreram no pecado capital de, no primeiro dia do mandato, trair o povo.
Como canta Bob Dylan: “the answer, my friend, is blowin’ in the wind” (a resposta, meu amigo, está soprando no vento). E os ventos que atualmente sopram na América Latina são desfavoráveis ao projeto bolivariano do Foro de São Paulo. A Argentina já segue o novo rumo, com a eleição do presidente Maurício Macri. A oposição conquistou a maioria na eleição parlamentar da Venezuela. O Chile segue a mesma toada. E o destino do Brasil não será diferente.
 
Artigo originalmente publicado no jornal A Tarde no dia 08/12/2015

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

JORGE RORIZ