CPI da COVID – As declarações do ex- ministro Nelson Teich

A CPI da Covid ouviu nesta quarta-feira (5) o ex-ministro da Saúde Nelson Teich. Ele disse que saiu do governo por falta de autonomia.

A sessão começou com uma homenagem ao ator e comediante Paulo Gustavo. Os senadores pediram um minuto de silêncio pela morte dele e dos outros milhares de brasileiros que perderam a vida para a Covid.

Em seguida, começou o depoimento de Nelson Teich, que ficou apenas 29 dias no ministério. Assim como o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, ele falou na condição de testemunha, com a obrigação de dizer a verdade.

Em uma curta exposição, Teich destacou a razão de ter pedido demissão do cargo: a falta de autonomia para trabalhar.

“Basicamente a constatação de que eu não teria autonomia e liderança que imaginava indispensáveis ao exercício do cargo. Essa falta de autonomia ficou mais evidente em relação às divergências com o governo quanto à eficácia e extensão do uso do medicamento cloroquina para o tratamento da Covid-19. Enquanto minha convicção pessoal, baseada nos estudos de que naquele momento não existia evidência de eficácia para liberar, existia um entendimento diferente por parte do presidente que era amparado na opinião de outros profissionais. Optei por deixar o cargo”, disse Teich.

Um dos focos da CPI é levantar os responsáveis pela ineficiência do país em lidar com a pandemia. A falta de vacina é um dos principais problemas. Foi o primeiro ponto a ser questionado pelo relator da CPI, Renan Calheiros, do MDB.

Renan: Durante sua gestão alguma medida estava em andamento para produção ou importação de vacinas?
Teich: No meu período não tinha uma vacina sendo ainda comercializada. Ainda era o começo do processo da vacina e foi quando eu trouxe a vacina da AstraZeneca para o estudo ser realizado no Brasil, para o Brasil ser um dos braços desse estudo, na expectativa de que trazendo o estudo a gente tivesse uma facilidade na compra futura.

Renan quis saber quem indicou o general Eduardo Pazuello para secretário-executivo do Ministério da Saúde. Pazuello assumiu a função na gestão de Teich. Na época, especialistas criticaram o fato de o segundo cargo mais importante da pasta ser ocupado por alguém fora da área de saúde.

Renan: O nome dele, foi o senhor que indicou?
Teich: Não, não, não. Ele foi indicado para mim pelo presidente.

Renan insistiu em perguntar se Pazuello, que depois ocupou o lugar de Teich, estava em condições de comandar o Ministério da Saúde.

“Na posição de ministro, eu acho que seria mais adequado um conhecimento maior sobre gestão em saúde”, afirmou Teich.

O vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues, da Rede, quis saber se Teich se sentiu pressionado pelo presidente Jair Bolsonaro a adotar a cloroquina como protocolo de tratamento da Covid.

Renan: Só para colaborar com a pergunta do senador Randolfe, em que momento o senhor percebeu, teve a certeza de que não tinha mais autonomia para continuar no cargo?
Teich: Essa é a pergunta bem objetiva do senhor?
Randolfe: Exatamente. O relator perfeitamente completou.
Teich: Naquela semana, teve uma fala do presidente na saída do Alvorada, onde ele fala que o ministro tem que estar afinado e cita meu nome especificamente. Na véspera, pelo que eu vi, teve uma reunião, acho que com empresários, onde ele fala que o medicamento vai ser expandido. À noite, tem uma live, onde ele coloca que espera que, no dia seguinte, vá acontecer isto, que vai ter uma expansão do uso. E aí, no dia seguinte, eu peço a minha exoneração.

No segundo dia de depoimentos, os governistas trocaram integrantes para tentar reforçar a tropa de choque.

Com base num acordo fechado na sessão de terça-feira (4), o presidente da CPI, Omar Aziz, do PSD, chamou a senadora Eliziane Gama, do Cidadania, para ser a primeira a perguntar depois do relator e do vice-presidente.

As perguntas normalmente começam pelos integrantes da CPI. Eliziane, que faz oposição ao Planalto, não é titular nem suplente, mas falaria como uma concessão à bancada feminina, que não tem nenhuma senadora na comissão. Os governistas protestaram e a sessão foi suspensa.

Na volta, a palavra foi dada a Eliziane Gama. Os senadores seguiram com os questionamentos, mas Teich, por várias vezes, foi evasivo. O presidente da comissão se irritou: “Trazer uma pessoa para depor que não lembra, que diz o seguinte, que houve, saiu, mas houve intervenção, mas não sabe quem interviu, quem quis… Então fica difícil para a gente.”

Os governistas reforçaram a tropa na CPI. Nesta quarta, o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra, do MDB, assumiu a vaga de suplente da CPI no lugar do senador Zequinha Marinho, do PSC.

Nas comissões, as vagas pertencem ao partido, que pode fazer as trocas quando quiser. A estratégia foi acertada mais cedo, em uma reunião com o presidente Bolsonaro. Na avaliação do Palácio do Planalto, no depoimento do ex-ministro Mandetta faltou ação dos governistas.

Nesta quarta, os aliados do governo centraram o fogo na defesa da cloroquina contra a Covid. Falaram sobre o medicamento, que não tem eficácia comprovada, em vários momentos.

O ex-ministro reforçou que mundialmente a cloroquina está descartada para uso contra a Covid.

“Eu não sei lhe dizer porque que os médicos prescrevem, já que existe hoje dentro das instituições de referência mundial um consenso em relação aos medicamentos. Não posso falar por eles, mas eu colocaria como inadequada ou errada essa prescrição, porque se a coisa não funciona e pode ter risco, não tem sentido fazer, porque você coloca risco sem agregar benefício”, disse Teich.

O senador Otto Alencar, do PSD, que é médico, explicou os riscos de tomar remédios sem prescrição: “Eu vi há pouco o senador Girão falando que a hidroxicloroquina é antiviral. Nunca foi antiviral. É um protozoário, malária. Fico olhando assim, os caras não se formaram em medicina, não ficaram no banco, não foram residentes, não estudaram nem química, nada disso, e receitam assim na maior, sabe qual é? ‘Pode tomar porque não tem nenhum problema’. Diz que não tem efeito colateral nenhum. A hidroxicloroquina tem efeito colateral, no coração. A ivermectina é neurotóxica. Se tomar uma droga, ivermectina com uma quantidade maior do que está prescrita, ela é neurotóxica, dá problema no fígado, como é que se receita desse jeito?”

O senador Luis Carlos Heinze, do Progressistas, leu uma lista de municípios que tiveram baixa mortalidade, supostamente, segundo ele, por uso da cloroquina, mas não apresentou comprovação dos resultados.

“Aqui eu tenho uma lista de quase 14 mil médicos. Eu vou lhe dar evidências que usaram esse tratamento e o adotaram do Amapá ao Rio Grande do Sul, os chamados médicos pela vida”, disse Heinze.

O senado Otto Alencar, mais uma vez, rebateu os argumentos dos governistas. Ele deixou claro que não há qualquer relação entre o uso da cloroquina e baixa mortalidade, e explicou, de forma didática, por que o fato de haver pacientes que tomaram cloroquina e se curaram não tem nada a ver com o remédio, e sim com o curso normal da doença. A maior parte das pessoas tem quadro leve ou moderado, independentemente do que tomem.

“É uma doença como a Covid-19, senador, em que 90% a 95% das pessoas que têm a doença cursam assintomático, leve ou moderado. Se tomar um copo de água, é a mesma coisa que tomar um comprimido ou dez ou vinte de hidroxicloroquina. A água é melhor, porque não dá efeito colateral. Então, como 90% a 95% das pessoas cursam dessa forma, não custa nada um charlatão receitar hidroxicloroquina, o doente ia ficar bom de qualquer jeito, e ele diz que foi a hidroxicloroquina que salvou o paciente. Então, eu não conheço, doutor Nelson, nenhuma virose que pode ser evitada por medicamento precoce. Será que quem toma uma carga de medicamento analgésico, uma criança, deixa de ter sarampo porque tomou analgésico? Não. Vai ter sarampo. Só não tem sarampo se tomar vacina. Varíola, a mesma coisa. H1N1, a mesma coisa. Paralisia Infantil, só vacina. As doenças viróticas, senador, são redutíveis ou evitadas por vacina, por vacinação”, explicou Otto Alencar.

 

Fonte: Jornal Nacional

 

 

 

JORGE RORIZ