Revelações do genocídio planejado – Bruna Morato

A CPI da Covid ouviu, nesta terça-feira (28), a advogada dos médicos que fizeram um dossiê contra a Prevent Senior. Bruna Morato disse que a empresa se uniu ao chamado gabinete paralelo para difundir o uso de medicamentos ineficazes contra a Covid e assim evitar que fossem decretadas medidas de isolamento que prejudicassem a economia.

A advogada Bruna Morato representa 12 médicos que trabalhavam na Prevent Senior. Eles produziram um dossiê de 10 mil páginas com denúncias de irregularidades que teriam sido cometidas pela empresa durante a pandemia.

Segundo a advogada, os médicos procuraram ajuda jurídica porque estavam sendo obrigados a receitar o chamado “kit Covid”, com remédios sem eficácia no combate ao vírus, como a cloroquina e a ivermectina.

A empresa tem acusado os médicos e a advogada de tentarem fazer um acordo para não levar as denúncias à CPI. Ela disse que não houve nenhuma irregularidade na tentativa de acordo, que os médicos temiam ser processados em caso de morte dos pacientes, todos idosos, e que queriam garantias jurídicas da empresa.

“Esse acordo não foi um acordo financeiro, o que é muito importante que se esclareça neste momento. Esses médicos estavam sendo ameaçados e hostilizados pelas famílias e estavam muito preocupados com a diretriz da empresa. Em julho, eles pediram que eu me aproximasse do jurídico da empresa, o que eu fiz, afinal, é o meu trabalho, pedindo para que a empresa tomasse três atitudes para que essas denúncias não fossem feitas às autoridades competentes. A primeira atitude requerida é que a empresa assumisse publicamente que o estudo não foi conclusivo, ou seja, não existiu, em nenhum momento no estudo, a comprovação da eficácia do tratamento que eles chamaram de preventivo, depois se transformou em tratamento precoce. O segundo pedido que eu tinha para levar ao jurídico da Prevent Senior era que eles assumissem o protocolo institucional, porque os médicos não tinham autonomia. E o terceiro e último ponto, que aí, sim, está relacionado a mim, era com relação à responsabilidade diante de possíveis ações”, disse a advogada.

Segundo a advogada, muitas vezes, ao entregar o kit, os médicos orientavam o paciente a não tomar os medicamentos contidos ali.

“Os plantonistas pegavam o kit, entregavam ao paciente e diziam ao paciente: ‘Olha, eu preciso te dar, porque, se eu não te entregar esse kit, eu posso ser demitido, mas eu te oriento: se você for tomar alguma coisa daqui, tome só as proteínas ou só as vitaminas’. Porque os outros medicamentos, além de não terem eficácia, são muito perigosos para aquele público em específico”, afirmou.

A advogada disse que, no início da pandemia, a operadora de saúde passou a trabalhar em sintonia com um grupo de médicos que estava assessorando o presidente Jair Bolsonaro, grupo que ficou conhecido como o gabinete paralelo da Saúde. Segundo ela, a intenção do governo era tentar impedir que fosse decretado lockdown no país.

 

“A Prevent Senior iria entrar para colaborar com essas pessoas. É como se fosse uma troca, a qual nós chamamos na denúncia de pacto, porque assim me foi dito. Alguns médicos descreveram como aliança; outros médicos descreveram como pacto. Havia um interesse inicial, vinculado ao governo federal, de que o Brasil não parasse, o Brasil não podia parar. Eles estavam extremamente preocupados com a possibilidade de lockdown, como todos, acredito que toda a população no geral. Existiria uma colaboração, com relação à instituição Prevent Senior, na produção de informações que convergissem com essa teoria, ou seja, de que é possível você ter ou você utilizar um determinado tratamento como proteção”, revelou.

De acordo com Bruna Morato, os pacientes da operadora de saúde foram enganados na hora de assinar o termo de consentimento de uso do “kit Covid”.

Renan Calheiros (MDB/AL): É verdade que o termo de consentimento para o tratamento era genérico, ele não falava especificamente do tratamento precoce ou da hidroxicloroquina?

Bruna: Era um termo genérico. Tanto o disponível no hospital quanto aquele que era disponibilizado via mensagem de SMS, em que o paciente dava um ‘Ok’. Muitos pacientes não liam.

A advogada disse que a intenção da Prevent Senior com o uso do “kit Covid” era reduzir os custos com a internação de pacientes.

Bruna: Era uma estratégia para redução de custos, uma vez que é muito mais barato para a operadora de saúde disponibilizar determinados medicamentos do que efetivamente fazer internação daqueles pacientes, e usariam aquele conjunto de medicamentos.

Omar Aziz (PSD/AM): A informação que a gente tem é que, por telefone, já mandavam o kit para casa.

Bruna: Sim.

As revelações da advogada Bruna Morato levaram os senadores da CPI a aprovar um requerimento que obriga a Prevent Senior a apresentar os documentos que comprovariam que os pacientes estavam conscientes dos riscos que estavam correndo ao tomar o chamado “kit Covid”.

O senador governista Marcos do Val, do Podemos, saiu em defesa da Prevent Senior e questionou a legitimidade da advogada para depor à CPI. A mesma estratégia foi utilizada pelos demais senadores da tropa de choque do governo.

“Ela, no início, falou que está representando 12 médicos e que tem 5 mil médicos ainda ativos na Prevent Senior. Fazendo um cálculo rápido, isso representa, esses 12 médicos, 0,25%. Eu acho que é uma porcentagem muito pequena para a gente achar que a exceção é a regra, porque não é possível que 5 mil médicos estariam em silêncio compactuando com tudo isso que está sendo dito”, disse Marcos do Val.

O relator, Renan Calheiros, do MDB, também quis saber detalhes sobre outra denúncia feita pelos médicos: a de que a Prevent Senior ocultou mortes por Covid, retirando do prontuário dos pacientes o código que indicava a doença depois de um período de internação. Na semana passada, em depoimento à CPI, o diretor-executivo da Prevent, Pedro Batista Júnior, disse que a medida era para indicar que os pacientes não precisavam mais do isolamento. Mas a prática contraria a ética médica e, segundo especialistas ouvidos pela TV Globo, pode configurar crime de falsidade ideológica.

Renan: O doutor Pedro Batista confirmou que o CID do paciente com Covid-19 era alterado no prontuário depois que eles ficavam cerca de duas semanas internados na Prevent Senior. Por que isso seria feito?

Bruna: Segundo as informações que eu tive, segundo nós podemos constatar nesses dois prontuários que foram entregues à Comissão Parlamentar de Inquérito, para que houvesse uma falsa sensação de sucesso com relação ao tratamento preventivo dentro da operadora de saúde.

Randolfe: Pelo que a senhora está dizendo, então, isso era uma prática recorrente? Era uma orientação?

Bruna: Era uma prática recorrente, considerando a determinação da empresa de obediência e lealdade.

Renan: Portanto, os números de letalidade da Prevent Senior não são confiáveis ou foram fraudados?

Bruna: Segundo informações dos médicos, esses números não condizem com a realidade porque existiam essas práticas administrativas que impediam que as autoridades tivessem conhecimento das informações corretas.

O senador Humberto Costa, do PT, disse que há uma conexão entre a demissão de Luiz Henrique Mandetta do Ministério da Saúde e a aliança entre a Prevent Senior, o gabinete paralelo e o Conselho Federal de Medicina, que permitiu aos médicos receitarem cloroquina e hidroxicloroquina sem o risco de responder a processo.

“No mesmo dia que o ministro Mandetta foi demitido, o Conselho Federal de Medicina emitiu um parecer que autorizava o tratamento precoce. Qual é a teoria que eu tenho na minha cabeça agora? O governo federal, o gabinete paralelo, o Conselho Federal de Medicina e a Prevent Senior atuaram em conjunto para permitir que essa situação acontecesse”, alegou o senador.

A senadora Eliziane Gama, do Cidadania, insistiu no assunto. Bruna Morato reforçou que a Prevent Senior e o gabinete paralelo tinham uma espécie de pacto.

“A informação que eu tive, uma vez realizado esse pacto ou aliança, entre esse conjunto de assessores que depois foram denominados por esta comissão parlamentar como sendo o ‘gabinete paralelo’, mas que, na época, eram apenas os assessores, é que, após esse contato, lhe foi transferida certa segurança. Então, a Prevent Senior tinha segurança de que ela não sofreria fiscalização do Ministério da Saúde ou de outros órgãos vinculados ao Ministério da Saúde. Inclusive, foi essa segurança que fez nascer neles o interesse de iniciar um protocolo experimental, cientes de que não seriam devidamente investigados ou averiguados pelo ministério”, afirmou a advogada.

Nota da Prevent Senior

 

A Prevent Senior divulgou nota repudiando e negando as denúncias. Segundo a empresa, o depoimento confirma que as acusações são infundadas e que serão desmontadas ao longo das investigações. A Prevent Senior disse que estranha o fato de a advogada manter o anonimato dos médicos e que ainda não teve acesso aos autos da CPI para fazer sua ampla defesa.

A empresa declarou que, ao longo da pandemia, constatou contágio por Covid em 56 mil pacientes, com um total de 7% de mortes, e que todos os casos foram rigorosamente notificados. A operadora disse que sempre respeitou a autonomia dos médicos e que nunca demitiu profissionais por causa de suas convicções técnicas.

O Conselho Federal de Medicina repudiou o que chamou de acusações falaciosas e sem qualquer contato com a realidade. Disse que há quase 70 anos atua para garantir aos brasileiros acesso à assistência digna e de qualidade e que qualquer denúncia contra os médicos tem que ser feita nos conselhos regionais. Disse ainda que em momento algum apresentou a terapia denunciada como medida eficaz ou solução efetiva para a pandemia. E que sempre incentivou o uso de máscara, distanciamento social e a vacinação em massa.

O Jornal Nacional também procurou o Palácio do Planalto para comentar as denúncias, mas não teve retorno.

JORGE RORIZ